Uma nova tecnologia capaz de prever, prevenir e combater incêndios florestais foi desenvolvida por investigadores do Politécnico de Leiria. O sistema DBoidS combina drones autónomos, inteligência artificial e realidade aumentada numa solução integrada que promete revolucionar a gestão de fogos rurais em Portugal.
Tecnologia de ponta contra um problema nacional
O projeto, liderado pelo Centro de Investigação em Informática e Comunicações (CIIC), representa uma resposta direta aos desafios que Portugal enfrenta na área dos incêndios florestais. António Pereira, investigador principal da iniciativa, sublinha que o país ocupou o segundo lugar na Europa em área ardida durante 2020, enquanto em 2017 registou os maiores incêndios florestais da União Europeia.
A grande inovação do DBoidS reside na sua capacidade de atuar na fase de previsão, uma lacuna que os sistemas existentes não conseguiam colmatar. “Os projetos anteriores concentravam-se principalmente na prevenção, combate e rescaldo, mas nós queríamos ir mais longe e antecipar os problemas”, explica António Pereira.
Drones que trabalham em equipa
O sistema funciona através de frotas de drones que operam de forma coordenada, contrariamente ao modelo tradicional de “uma pessoa, um drone, uma missão”. Cada aparelho recebe uma tarefa específica, mas todos trabalham em conjunto sob a supervisão de um centro de operações.
O processo inicia-se com o cálculo de um índice global de incêndio, que identifica as zonas florestais de maior risco. Os drones são então destacados para essas áreas, onde monitorizam continuamente o terreno através de algoritmos previamente treinados para reconhecer fontes de ignição e comportamentos suspeitos.
Quando detectam movimento – seja de pessoas ou veículos – os aparelhos transmitem imediatamente um alerta para o centro de comandos. Os operacionais podem então visualizar as imagens em tempo real, enriquecidas com realidade aumentada, e avaliar se existe perigo real.
Inteligência artificial prevê cenários
Em caso de incêndio confirmado, o sistema recorre à inteligência artificial para calcular a velocidade de propagação das chamas e simular possíveis cenários de evolução. Esta capacidade preditiva permite às autoridades tomar decisões mais informadas e preparar estratégias de combate mais eficazes.
O DBoidS mantém ainda um registo completo de todas as ocorrências, incluindo imagens que permitem identificar claramente a origem de cada incêndio. Esta funcionalidade revela-se especialmente valiosa para investigações posteriores e para a implementação de medidas preventivas.
Parceria com autoridades nacionais
O desenvolvimento do sistema contou com a colaboração de várias entidades oficiais, incluindo a Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil, a Guarda Nacional Republicana, a Polícia Judiciária e o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas.
Esta parceria garantiu que o DBoidS fosse desenhado para se integrar facilmente com os sistemas já existentes, funcionando como um complemento às ferramentas atualmente utilizadas pelas autoridades competentes.
Demonstração prática na Lagoa da Ervedeira
Os resultados do projeto foram apresentados publicamente numa demonstração realizada na Lagoa da Ervedeira, em Leiria, que permitiu aos presentes observar o sistema em funcionamento. A sessão demonstrou as capacidades do DBoidS em condições reais, validando três anos de desenvolvimento e investigação.
O projeto, que arrancou em 2022 com financiamento da Fundação para a Ciência e Tecnologia, foi desenvolvido em parceria com o INESC TEC – Instituto de Engenharia de Sistemas e Computadores, Tecnologia e Ciência.
Próximos passos
Com o protótipo concluído, o objetivo passa agora pela transferência da tecnologia para as autoridades competentes. António Pereira encara esta fase não como um fim, mas como um novo começo: “Desenvolvemos investigação com aplicação prática na sociedade, e temos aqui todas as bases para crescer ainda mais e ver este sistema no terreno”.
Carlos Rabadão, presidente do Politécnico de Leiria, defende que o DBoidS representa uma resposta aos desafios persistentes do país nesta área. “Portugal enfrenta um contexto particularmente sensível relativamente aos fogos florestais. Apesar dos progressos nos sistemas de monitorização, prevenção e combate, os desafios persistem”, afirma.
O dirigente académico advoga por uma abordagem integrada que envolva o Estado, autarquias, proprietários, investigadores e sociedade civil, com foco na prevenção estrutural, educação ambiental e ordenamento do território como pilares fundamentais para mitigar os riscos dos incêndios florestais em Portugal.